Diário de Cuiabá – Cuiabá, sábado, 22 de julho de 2000 – OPINIÃO – A

″ PEDRO LIMA

Os historiadores mato-grossenses têm ignorado e, na maioria das vezes, quando es­crevem sobre a revolução Morbeck x Carvalhinho, por não se preocuparem em pes­quisar com seriedade, não são comprometidos em relatar os fatos como se passaram.

O escritor Jurandir da Cruz Xavier, em seu livro “Poxoréo e o Garças”, foi o primeiro mato-grossense que se preo­cupou em fazer uma pesquisa séria e relatar os fatos com a responsabilidade de quem es­creve para o público. No dia 15 de julho, uma data que pas­sou despercebida para a im­prensa do nosso Estado, fez 85 anos que se praticou o primei­ro ato de entreguismo da rique­za mato-grossense a um gru­po estrangeiro.

O então presidente do Es­tado, Joaquim Augusto da Cos­ta Marques, assinou um decre­to de concessão a uma multi­nacional – Cia. Indústria e Co­mércio – uma mineradora para exclusividade de exploração das jazidas minerais, metais, metalóides, fósseis etc, exis­tente no Vale do Rio Garças e seus afluentes desde a cabe­ceira até a foz no rio Araguaia. Desse gesto do então presiden­te do Estado, surgiu em Mato Grosso o primeiro grito nacio­nalista que se tem noticia em Mato Grosso.

O Dr. José Morbeck (en­genheiro agrônomo), formado pela Faculdade de Agronomia da Bahia, ocupava o cargo de diretor da Repartição de Ter­ras, Minas e Colonização do Estado. Ao lhe chegar às mãos tal decreto, deu um incisivo pa­recer contrário; pois se este prosperasse, iria criar um se­ríssimo problema social na re­gião, onde trabalhavam milha­res de garimpeiros em sua grande maioria nordestinos, com uma grande maioria de baianos e maranhenses. Por ter se recusado a apor sua as­sinatura no decreto do entreguismo, Morbeck, pediu e foi aceita a sua exoneração do cargo, tendo retornado para Alto Araguaia.

Com o impacto do seu pa­recer e da sua saída do gover­no o decreto ficou sobrestado pelo temor do presidente do Estado das conseqüências que poderiam advir em razão da grande liderança de Morbeck na região dos garimpos. Até que já no governo Dom Aquino Corrêa, que por sinal, era compadre do Dr. Morbeck, padrinho do seu filho Milton, o grande líder resolveu o assun­to de vez ao passar ao presi­dente do Estado o seguinte te­legrama: “ou cai a concessão ou arrebenta a revolução.”

Posteriormente já no go­verno Pedro Celestino em 1.925, Morbeck tornou a atritar com o governo que insistia em cobrar impostos dos garim­peiros numa região em que o poder público era ausente. Não dava, não prestava o menor serviço à população.

Até que numa histórica reu­nião em Cassununga, foi cria­da a liga garimpeira e assinado um tratado com o governo, ocasião em que ficaram esta­belecidas as condições de con­vivência, direitos e obrigações recíprocas. Assinado em Cassununga, em 22 de fevereiro de 1.925, o documento levou as seguintes assinaturas: Eng. Agrônomo José Morbeck, Cândido Soares Filho, Antônio Bonifácio Pires, José de Barros Cavalcante, Joaquim Fer­reira Laborão, Salvador Hora, Ondino Rodrigues Lima, Leo­nardo Cortez e Joaquim de Souza.

E preciso que se pesquise, levantando os arquivos da his­tória, ouvir os remanescentes dos dois lados para se enten­der o porquê de o presidente Pedro Celestino não haver cumprido a sua parte no trata­do, o que deu origem a revolu­ção Morbeck x Carvalhinho, que erroneamente ficou co­nhecida como Baianos x Ma­ranhenses, já que o Dr. Morbeck era baiano e, entre os lu­gares – tenente havia vários baianos. Provavelmente, pelo fato do comandante das for­ças de Morbeck, Ondino Ro­drigues Lima ser maranhense, ficou essa marca de rivalida­de entre dois povos que só que­riam trabalhar em paz.

Pedro Celestino conhecen­do a liderança de Morbeck, in­teligentemente percebeu que só poderia combatê-lo se divi­disse o seu grupo, usando al­guém a ele ligado.

Manoel Balbino de Carva­lho, conhecido como Carvalhinho, amigo e compadre do Dr. Morbeck, descendente de família de força política na Bahia, homem ambicioso de imediato aceitou fazer o jogo do entãc presidente do Estado. Apesar de Carvalhinho contar com o apoio do governo, não tão so­mente da Força Pública de Estado, mas também recurso: financeiros para recrutar ja­gunços na região das lavra: diamantinas na Bahia, as vitórias e derrotas se alternaram, porque Morbeck rece beu apoio do Marechal Rondon. Por influência de Rondon o governo de Minas Geral forneceu armamentos a Morbeck.

A revolução terminou com a posse de Mário Corrêa que retirando a Força Pública da luta armada forçou um armistício. O melhor livro já escrito embora ainda falte muita coisa a ser dito, é o do Jurandir da Cruz Xavier, já citado no início do artigo.

O Dr. José Morbeck foi até hoje o maior líder regional de Mato Grosso. E, provável mente, um dos maiores do Brasil.

Com um telegrama ou uma carta ele levantava milhares de homens em armas. A sua liderança era alicerçada na sua lealdade aos seus liderados nas suas posições firmes voltadas para os interesses maiores da população numa época em que o único mercado de trabalho eram os garimpos de diamantes.

″ PEDRO LIMA é analista político colaborador do Diário.

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